Há pouco tempo ouvi na rádio uma citação de Mark Twain que dizia “deixar de fumar é das coisas mais fáceis de fazer; eu pessoalmente já o fiz centenas de vezes”. Sinto o mesmo relativamente ao açúcar refinado, uma substância que por todos os padrões racionais seria considerada altamanete tóxica – mas que ao mesmo tempo (e como a generalidade das coisas viciantes) é tão deliciosa e agradável de consumir.
Nesta série de posts vou partilhar algumas das técnicas que têm tido melhor resultado na minha experiência nesta área, das técnicas mais simples à mais sofisticadas, partilhando o muito que esta aventura me tem ensinado.
Há uma coisa que é importante perceber para começar qualquer desafio: qual a duração do desafio? É um sprint ou uma maratona? As abordagens podem ser completamente diferentes, embora todas as modalidades beneficiem de treino.

Atualmente estou a fazer a largada do açúcar numa lógica de maior continuidade (pelo menos um ano), onde, pela natureza da utilização social dos doces (celebrações, demonstrações de carinho e generosidade para connosco) faz sentido incluir algumas exceções; se o desaio for de uma semana ou de um mês, talvez seja ideal não escolher periodos de tempo em que se tem casamentos, aniversários ou festividades como o natal.

Também é importante perceber porque é que se está a largar o açúcar: é um caso de diabetes? É para lidar com alguma doença crónica (vários doentes oncológicos que eu conheço quiseram deixaro açúcar para ajudar a combater o cancro, por exemplo)? É para emagrecer? É para melhorar a saúde em geral?

A vez que estive mais tempo sem consumir açúcar refinado foi durante a minha gravidez e primeiros meses de vida do meu filho: sei que é uma substância viciante e não particularmente benéfica para a nossa saúde e quis que ele pudesse não nascer “viciado”.
A minha experiência foi super interessante na medida em que (ao contrário de quase todas as ocasiões desde a minha adolescência) não estava a tentar emagrecer e por isso (e porque estar grávida e amamentar dão uma fominha épica) comi como uma desalmada nesse periodo; curiosamente emagreci quase quinze quilos. Também fiquei com uma pele ótima e depois do periodo de ressaca os meus níves de energia e humor estabilizaram no seu nivel médio habitual.
O que acontece tipicamente na primeira semana sem açúcar?
Aviso já, dependendo no nível de adição, a primeira semana é SUPER difícil. Está documentado amplamente na literatura científica, mas posso testemunhar também pessoalmente que a ressaca ou síndrome de abstinência de açúcar são reais.

Pode ir de um mau humor e irritabilidade insuportáveis, a letargia, dores de cabeça, humor deprimido, incapacidade de se concentrar, etc. Até tremores pode dar, não estou a brincar.
No contexto em que a pessoa é saudável e está “apenas” a tentar lidar com a adição, é importante percebermos o que está a acontecer para conseguirmos ultrapassar; penso que uma forma de apaziguar estes efeitos, ao mesmo tempo que vamos desenvolvendo um vocabulário alimentar sem açucar maior (ah sim, é muito possível que em breve descubram que a maior parte dos vossos go-tos são coisas que levam açúcar adicionado) é tentar não baixar muito os níveis de glicose no sangue, recorrendo a alimentos sem açúcar adicionado, como bananas (que eu gosto de comer com manteiga de amêndoa), ou pão com manteiga, ou um cafezinho com leite, iogurte grego natural, etc.
Não são coisas propriamente light – nem é suposto serem! A primeira semana é tudo sobre a adaptação do nosso corpo (e em especial o nosso cérebro) à ausência de açúcar. Trata-se de encontrarmos alimentos, snacks e estratégias de gestão de stress que não sejam comida açucarada: por si só já é uma coisa difícil, não faz sentido acrescentar mais dificuldade a este processo.

Assim, a primeira coisa que eu sugiro que se faça (e que seja o foco da primeira semana) é ter uma panóplia de coisas que podemos comer e que não têm açúcar adicionado (embora possam ser docinhas por si só).
Recomendo ter em casa e “à mão de semear”
- frutos secos (amêndoas, nozes, nozes pecã, avelãs, avelãs torradas, etc)
- bananas
- manteiga de amêndoa e/ou amendoim
- pão e manteiga, queijo e/u fiambre (mais para a frente poderá decidir-se que o pão branco não vale, mas na primeira semana sugiro não retirar o mesmo)
- palitos de cenoura
- cubos de queijo
- fruta fresca
- fruta seca (tipo damascos, figos, ameixas, etc)
Comer coisas ricas em proteína vai ajudar a saciar a fome, por isso são uma boa aposta; à medida que o paladar se for modificando com a ausência de açúcar refinado, a fruta vai começar a saber mais doce e vai ser mais eficaz a satisfazer a necessidade de comer algo doce.

Recentemente li no livro “Genius foods” de Max Lugavere que ao deixar o açúcar pode haver uma quebra no sódio que o nosso organismo processa/tem acesso e por isso no início pode ser relevante aumentar um pouco esse mesmo consumo diário – fica a dica adicional.
Este é o ponto de partida que eu sugiro: preparar uma semana em que se come muito (até mais do que o habitual) mas nada tem açúcar adicionado e idealmente não serão alimentos processados, de modo a combater um pouco o mau humor e efeitos secundários que vão existir da ausência de doces.
Vale a pena nesta semana começar a olhar para rótulos e decidir usar menos comida processada industrialmente, mas numa lógica de continuidade e sucesso a longo prazo, penso que é fundamental começar devagar, com estratégias sustentáveis.
Boa sorte!