E por Vezes
E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos
E por vezes
encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes
ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites
não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos
David Mourão-Ferreira, in ‘Matura Idade’
(1927-1996)
Conheci este poema na música cantada pela Cristina Branco, numa altura em que a minha irmã a ouvia muito. Gosto especialmente da interpretação da Cristina Branco, mas o poema em si é também muito bonito com a forma como demonstra a relatividade da perceção da passagem do tempo e de como esta relatividade tem tantas vezes a ver com as pessoas com quem estamos física, psicológica ou emocionalmente.